Considerada um dos nomes mais importantes da literatura contemporânea, Maria da Conceição Evaristo de Brito, de 72 anos, usa a escrita, acima de tudo, como um ato político. Dona de uma produção literária diversificada, ela já escreveu romances, contos, poemas, novelas…

Nascida e criada na periferia de Belo Horizonte, a jovem Conceição Evaristo, segunda de nove filhos de uma lavadeira, trabalhou como doméstica, concluiu o magistério e começou a lecionar. Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1972 e ingressou na UFRJ no curso de Letras, fez mestrado com a dissertação Literatura Negra: uma poética da nossa afro-brasilidade e conseguiu o título de doutora com a tese Poemas Malungos – Cânticos Irmãos. Atualmente leciona como professora visitante na UFMG.

Foi no início dos anos 90 que começou a publicar os seus contos e poemas na série Cadernos Negros, do Quilombhoje que proporcionava visibilidade aos escritores negros e periféricos. Em 2003 lançou o seu primeiro livro Ponciá Vivêncio. Filha de negros alforriados e vivendo uma vida paupérrima, acompanhamos a trajetória de Ponciá, da infância até a vida adulta. Durante a narrativa a autora faz uma crítica à herança do período escravocrata, à desigualdade social e racismo que atingem a sociedade, sem perder o lirismo. O livro também foi publicado nos Estados Unidos e França.

Em 2006 lançou Becos da Memória, que expoe a vida de quem vive o preconceito, a fome, a miséria e luta pela sobrevivência dia após dia. O livro é presença em alguns vestibulares desde então. Insubmissas lágrimas de mulheres (2011) é um retrato de solidariedade e união entre mulheres. São 13 contos que expõem as dores, aflições e como mulheres negras lutam para fazer com que todos esses sentimentos se tornem um meio de resistência. Em 2014 lançou Olhos D’Água, uma coletânea de contos que venceu o prêmio Jabuti de 2015. Histórias de leves enganos e parecenças lançado em 2016 é composto por 12 contos e uma novela com uma escrita que abre um leque de interpretações diversas.

No ano passado candidatou-se a 7° cadeira da Academia Brasileira de Letras (ABL). Houve uma intensa mobilização nas redes sociais, mas Conceição recebeu apenas um voto e quem ocupou a 7° cadeira foi Cacá Diegues. Ela abriu mão das formalidades como jantares e cortejamento de possíveis padrinhos na fase pré-eleitoral. Apesar de esperada a derrota, expôs e gerou discussões sobre a falta de representatividade negra e feminina na academia centenária que hoje conta com apenas um negro e cinco mulheres nos seus assentos. Segundo a autora, a mulher negra é vista como aquela que é boa no samba, no sexo, boa para limpar a casa do patrão e cuidar das crianças, mas quando se fala em habilidades intelectuais elas ainda ficam em segundo plano.

O livro Canção Para Ninar Menino Grande (2018) foi o primeiro livro com um personagem principal masculino. Nem por isso as mulheres são ausentes ou inexpressivas na narrativa, já que conhecemos o personagem principal pelos olhos das mulheres que o cercam.

Na Flip deste ano o escritor homenageado foi Euclides da Cunha e Conceição participou da mesa “Escrevivências e andanças: prazer em ler, direito de escrever”. Atualmente, a escritora é presença disputada em feiras e eventos literários. Este mês recebeu o título de personalidade literária do ano pelo premio Jabuti.

Todas as obras de Conceição Evaristo retratam a mulher negra, as desigualdades sociais, de gênero e raça. O racismo institucionalizado, a violência, fome, resistência e luta do povo negro, pobre e periférico. A condição de mulher negra marca sua escrita de uma forma consciente. Pobre e criada na periferia ela escreve sobre o que conhece o que dá mais sentido para o conceito “escrevivência” criado pela autora. Nada mais é que a escrita fruto do cotidiano, lembranças e experiências de vida. A escrita como meio resistência.

Em fase de construção, Flores de Mulungu é o nome de sua próxima obra que abordará o tema da diáspora sob os olhos de uma matriarca de 107 anos. Em entrevista recente à revista Marie Claire, quando questionada sobre os tempos difíceis que vivemos atualmente ela disse: “Nessas horas, gosto de lembrar a história dos africanos e de seus descendentes. Quando fugiam pro quilombo, eles não tinham certeza nenhuma se alcançariam a liberdade. O que fortalecia esse sujeito? O desejo da liberdade e a crença nesse direito. Só isso, mais nada a favor. Pelo contrário. Se fosse recapturado, o castigo era pior. E, no entanto, ele fugia. Estamos numa situação de vulnerabilidade muito grande, mas, enquanto a gente tiver a certeza do direito à vida, isso nos mantêm de pé.”

 

Luana Bernardes Primani. Sou de Araraquara, interior de São Paulo, tenho 35 anos e sou funcionária pública na área da saúde. Desde que aprendi a ler os livros se tornaram meus companheiros inseparáveis. Atualmente estou lendo literatura africana e sempre que posso ou me empolgo acabo escrevendo também.

 

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