O filme Judas e o Messias Negro conta a trajetória do ativista e líder político Fred Hampton (Daniel Kaluuya), presidente da seccional do partido Panteras Negras em Chicago. Tudo começa quando o FBI oferece um acordo judicial para William O’Neal (Lakeith Stanfield) se infiltrar na organização dos Panteras Negras, com a missão de coletar informações sobre Hampton. A notoriedade de Hampton e a sua liderança revolucionária preocupavam a elite estadunidense que o via como uma grande ameaça. É Hampton quem é visto como o “messias” e William, o “judas”. Como e porquê Fred Hampton é traído por seu companheiro de partido é o desenrolar do filme.

Sem sombra de dúvida esse ‘‘clássico’’ dirigido por Shaka King tem o intuito de mostrar a importância do movimento socialista negro nos Estados Unidos. Um exemplo disso reside no poder revolucionário proposto pelos Panteras Negras, no qual o filme — ao contrário de muitos outros títulos hollywoodianos — não faz questão de esconder sua potência revolucionária e crítica anticapitalista.

 

Cena de Judas e o Messias Negro

 

Atrevo-me a fazer um paralelo entre a relação de William O’Neal e o FBI  retratada no filme e a ideia do ‘‘Negro da casa grande’’ e o ‘‘Negro do campo’’, proposta por Malcolm X. No filme, William só se preocupa consigo mesmo, afinal a vida de um cidadão negro norte-americano não era fácil. Claro, isso não justifica suas atitudes ruins ao longo da trama. Seu comportamento se aproxima do pensamento do ‘‘Negro da casa grande’’, que queria ser um homem branco ou tratado como um, pelo simples fato de apoiá-lo ou servi-lo. Por receio de sofrer represália por parte da supremacia branca, O’Neal se mantém longe daqueles que estão lutando contra a segregação racial e brutalidade policial tal qual o ‘‘Negro do campo’’, que não se acomoda com as chicotadas de seu ‘‘senhor’’, pois sua luta está em encontro com a liberdade de seu povo. Devido a essa construção racista herdada pela escravidão, O’Neal se vê entre a sobrevivência e a morte.

 

William O’Neal à esquerda e à direita Lakeith Stanfield o interpreta no filme.

 

Não posso deixar de mencionar, entretanto, a linda frase dita por Hampton e atribuída ao líder cubano, Che Guevara: “As palavras são lindas, mas a ação é suprema”. Diante disso é inegável o imenso legado que os Panteras Negras nos proporcionou, ao contrário das ilusórias políticas do mundo contemporâneo, com falsas promessas de progresso e assistência ao povo. O movimento de fato ajudou a população negra americana com o auxílio de ações afirmativas e na segurança pública (autodefesa) do contingente negro. ‘‘Você pode matar um revolucionário, mas não pode matar a revolução’’, realmente essa frase retrata com perfeição o papel, protagonismo e luta que teve essa organização urbana socialista revolucionária fundada por Huey Newton e Bobby Seale.

Em síntese, pode-se dizer que Judas e o Messias Negro é um sucesso, isso justifica as seis indicações que recebeu ao Oscar de 2021, incluindo de melhor filme. Não posso esquecer de elogiar também os atores que deram vida aos personagens do enredo, em especial Daniel Kaluuya que interpretou muito bem o papel do grande líder do partido Panteras Negras. Kaluuya acabou levando o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante por este papel, mas antes já havia levado para casa um Globo de Ouro, um Critics’ Choice Award, um SAG Award e um BAFTA.

 

Daniel Kaluuya recebendo o Oscar.

 

O ruim desse drama é que ele acaba. Claro, chorei horrores com a morte de Fred e dos membros do partido. Quanto ao William, por mais que em alguns momentos parecesse arrependido do que estava fazendo, não deixo de me sentir decepcionada com o personagem. Enfim, odiar o ‘‘Judas’’ nos faz cair em uma ilusão criada pelo imaginário branco, na qual odiaríamos a nós mesmos e esqueceríamos da opressão policial. A questão da traição de O’Neal é imperdoável, porém os inimigos maiores são outros. Aqueles que se beneficiam com a privação da liberdade do povo negro, inclusive com a liberdade de William.

 

Ludmila Tavares Oliveira, estudante de Direito de cidade de Anápolis/GO.

 

Editado por Bruna Rangel e revisado por Júlia Zacour.

 

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