Quase metade das mulheres negras e latinas que trabalham como cientistas já foram confundidas com zeladoras ou administradoras, revela um novo relatório [em inglês] sobre as experiências de mulheres negras e latinas que trabalham nas áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática [representadas em inglês pelo acrônimo STEM]. Como uma estatística latina contou a pesquisadores, “Eu sempre divirto meus amigos com minhas histórias de zeladora, mas não era só em horários estranhos que elas aconteciam”. Ela calmamente informou a essa pessoa de que tinha a chave do escritório, não do armário do zelador.

Esse detalhe é parte de “Risco Duplo: Preconceito de Gênero Contra Mulheres Negras na Ciência” [em inglês], o novo relatório do Center for WorkLife Law da Universidade da Califórnia, que fez uma pesquisa com 500 cientistas do sexo feminino e conduziu entrevistas qualitativas com mais 60. Ele fornece um olhar condenatório sobre o modo como o preconceito de gênero e o racial impactam a saúde mental das mulheres e suas carreiras. O senso comum nos diz que mulheres não estão presentes nas ciências na mesma medida que os homens por causa da falta de incentivo recebido por meninas para investirem em carreiras nas áreas STEM e por elas serem mais propensas a abandonar suas carreiras para terem filhos. Mas as entrevistas mostram que essas explicações deixam de fora o ambiente hostil e desencorajador que muitas mulheres têm de enfrentar em salas de aula, escritórios e laboratórios dominados por homens. Das 60 cientistas entrevistadas no relatório, 100% reportou terem tido experiências com discriminação de gênero em suas carreiras. Mais de 75% das cientistas afro-americanas que participaram da pesquisa relataram ter tido de provar sua inteligência diversas vezes. Elas sentem que não podem se dar ao luxo de cometer um único erro. “Risco Duplo” expõe quatro padrões distintos e difundidos de discriminação nas áreas STEM:

1. Prove de Novo: mulheres frequentemente têm de apresentar mais provas de sua competência para serem tratadas como seres tão capazes quanto os homens. Ainda assim, um estudo mostrou que, quando um homem e uma mulher têm as mesmas habilidades matemáticas, em 90% das vezes um empregador escolheria contratar o homem.

2. A Corda Bamba: mulheres se veem sobre a linha tênue entre serem vistas como “femininas demais para serem competentes” e “masculinas demais para serem ‘gostáveis’”. Metade das mulheres entrevistadas disse ter sofrido retrocessos por terem sido assertivas. É especialmente provável que mulheres latinas nessas áreas digam que seus colegas de trabalho as acusam de serem “nervosas”.

3. O Muro Maternal: mulheres trabalhando nessas áreas enfrentam a suposição de seus colegas de que seu comprometimento com o trabalho irá diminuir caso elas tenham filhos. Por outro lado, muitas mulheres sem filhos relataram que se espera que elas trabalhem por mais horas por não terem filhos para criar.

4. Cabo de Guerra: mulheres que sofrem com preconceito de gênero no início de suas carreiras são mais propensas a se distanciar de outras mulheres. Os pesquisadores chamam isso de efeito “abelha rainha”.

A designer de jogos Elizabeth Sampat recentemente discutiu isso em nosso podcast [em inglês] como uma situação do tipo “garota legal no clube dos meninos”.  Enquanto a realidade que esse relatório apresenta é entristecedora, é igualmente afirmador para as mulheres trabalhando nas áreas STEM saberem que os retrocessos e discriminações muitas vezes sutis que enfrentam não acontecem apenas com elas individualmente. Essa pesquisa aponta que a realidade da falta de mulheres – especialmente mulheres não brancas – em laboratórios, empregos de ciência da computação e carreiras matemáticas pelo país afora [EUA] é sintomática do racismo e do machismo profundo em nossa cultura.

Campanhas de educação primária no estilo “feel-good” [em inglês] que encorajam menininhas a correr atrás de seus interesses em ciência são absolutamente necessárias. Mas, além isso, precisamos desafiar os problemas culturais obscuros e repugnantes resultantes do racismo e do machismo entranhados na sociedade.   O relatório aponta que o preconceito de gênero e a falta de esforço real para diminuir as desigualdades são mais persistentes em áreas em que mulheres representam menos de 20% dos trabalhadores. Para fazer com que o número de cientistas mulheres cresça, precisamos chegar ao ponto em que nenhuma delas é rotineiramente confundida com zeladoras.

Originalmente publicado no site Bitch Media.Imagens da página Preta e Acadêmica.

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