Recebi esse livro da Editora Planeta na época em que estava sendo lançado, em meados de junho. Logo dei uma folheada e me interessei pela história. Só que acabei o deixando na estante – um hábito infelizmente comum dada a correria da vida -, ainda me convencendo que “qualquer dia desses” o pegaria para ler. E o qualquer dia desses chegou na forma de um fim-de-semana que eu passaria num hotel fazenda no interior do Rio de Janeiro.

Tendo em mente que por o local ser em meio às montanhas meu acesso à internet seria limitado – e, como vim a descobrir, praticamente inexistente -, a companhia de um bom livro se mostrou absolutamente necessária. E como foi. O Ano Que Morri em Nova York – um romance sobre amar a si próprio, escrito pela jornalista Milly Lacombe, conta a história de uma mulher lésbica de quarenta e poucos anos devastada com o fim de um relacionamento de uma década, voltando para São Paulo praticamente sem dinheiro, sem emprego fixo, sem onde morar, sem o – ou um – grande amor da sua vida e com… vamos colocar assim: um belo par de chifres.

Milly – o livro é contado em primeira pessoa e tem “viés autobiográfico” – vivia com Tereza um relacionamento apaixonado e invejado por todos. Até que tudo desmorona. Tereza viaja a negócios e, nesse tempo, a protagonista recebe uma notícia devastadora: sua melhor amiga, Simone, está com câncer. Desnorteada, a paranoia se instaura e é quando surge a desconfiança de estar sendo traída, que perdura mesmo com a volta de Tereza. Detalhes como não responder mensagens imediatamente, pequenas mudanças na rotina de Tereza, como ficar muito mais no celular e um cumprimento carinhoso em uma colega de trabalho – uma mulher linda e de unhas meticulosamente aparadas que Tereza conheceu na viagem (entendedoras entenderão) – abalam o psicológico da protagonista ao ponto de ela própria se perder de vista. E ao se perder que surge a necessidade de se encontrar.

Milly é puxada por uma amiga para um retiro espiritual na Amazônia – um ambiente totalmente inadequado para alguém acostumada ao concreto paulistano. Lá ela aprende a abandonar seu ceticismo e ver a vida com outros olhos. Ou melhor, se ver com outros olhos. Pulando de um relacionamento para o outro, a perspectiva de Milly perante a própria vida era sempre definida pelo olhar que seu par tinha dela. A mudança de perspectiva de não se definir por um relacionamento e poder olhar para si mesma traz o questionamento: quem sou eu?

Nessa jornada de autodescobrimento, Milly também passa uma temporada em uma casa isolada ao sul de Minas, onde mais uma vez se vê refletindo sobre toda sua experiência. Aprende, também, a apreciar a solidão de sua própria companhia. É por essas e outras situações pelas quais passa que nos vemos envolvidas pela história e os ensinamentos que brotam dela.

Esse romance conta a jornada de Milly, mas por diversas vezes podemos nos ver naquelas páginas. Surge naturalmente no leitor a curiosidade em descobrir porque o relacionamento terminou, porque ela foi traída ou se realmente foi traída. Na medida que queremos descobrir tudo isso, o que vemos é a protagonista descobrir a si mesma. E é esse desabrochar a verdadeira essência do livro e o que de mais precioso tiramos dele. Afinal, quem nunca precisou renascer? Ou ainda precisa?  

 

Sobre a autora

 

Milly Lacombe nasceu no Rio de Janeiro em 1967. Cursou Rádio e TV na FAAP, atuou por alguns anos no mercado publicitário e substituiu o ofício pelas ocupações de jornalista e escritora. Trabalhou em grandes veículos de comunicação e já frequentou bancadas de programas esportivos do SporTV e da TV Record. Há quinze anos escreve sobre diversidade de gênero na Tpm e na Trip. É autora de cinco livros, entre eles Segredos de uma lésbica para homens, Tudo é só isso e Over the rainbow.

Milly Lacombe

Bruna Leão é graduada em Direito pela Universidade de Brasília. Passa seu tempo livre vendo séries de tv, não fazendo dieta e ocasionalmente bebendo uma cerveja porque ninguém é de ferro. Seus livros são sua paixão e um dos seus maiores sonhos é ter uma biblioteca em casa. Mais em crise que o capitalismo. Só é séria no LinkedIn.