Esse até parece mais um daqueles assuntos massantes que a gente não para de ouvir por aí, mas não é. Na minha bolha, a maternidade real é pauta, mas na vida de muita gente não. Até mesmo na bolha, a maternidade romantizada dá as caras, afinal, é enraizada.

Este texto não é apenas para mães, mas endereçado a todos que convivem com esses seres que esperam por ajuda, como uma formiga por açúcar. Parece que depois que nos tornamos mães, a sociedade nos coloca num potinho e nos classifica como aquela que precisa abdicar da sua vida, do que é, e do que deseja em razão da nova condição social. A mãe tem sim de se sacrificar pelo filho, onde já se viu? E o pai nessa história? Com certeza continuando com a sua vida da mesma forma de sempre. Construindo carreira, tendo um tempo pro chope e futebol com os amigos. Claro, tem aqueles que fazem sua obrigação, mas o intuito aqui não é aplaudir alguém por fazer o que tem de fazer, isso é o mínimo. Afinal, uma criança não é feita sozinha.

Mas vamos voltar lá na fecundação. Você descobre que está grávida. Muitas vezes, aconteceu sem o planejamento, você quer, mas tem medo, ou não quer, mas não tem condições de realizar um aborto porque o Estado não te garante esse direito (Lembrando que pílulas falha, camisinhas estouram e DIU’s batem palminhas no útero da gente e a mágica acontece). Então, o que você faz? Começa o pré-natal. Você não é mais você, agora, tem de cuidar de alguém que está dentro. Exames, alimentação, roupas, você não existe mais, as pessoas não te enxergam mais como uma mulher, mas alguém que vai dar a luz. Primeira perda de identidade social concluída com sucesso.

Chá de bebê, roupas, fraldas. Condução com o barrigão. Se você está desempregada, não te contratam, se você é recém parida, não te contratam, e, em muitos lugares, só por ser uma mulher cis e ter a possibilidade de engravidar, algumas empresas sequer chamam. Ninguém olha se você tem experiência, se é a melhor no que faz, se cumpre prazos. As pessoas querem saber com quem você vai deixar seu filho, o que nos coloca nos tempos das nossas avós cujo a única função era criar os filhos, pois trabalhar fora, era “serviço do homem”. Por mais que tenhamos discursos de igualdade em muitas empresas por aí, a gente sabe que não é bem assim que a banda toca e, mais uma vez, sua identidade social foi pro saco.

Chegou a hora de parir. Despreparo profissional e violência obstétrica. Seu corpo, suas vontades e o tal plano de parto não são respeitados, e por quê? O seu corpo, as regras deles. Chega em casa, puerpério sentadinho no sofá só esperando a hora de atacar, mas antes, vamos receber a visita dos amigos, aliás, que amigos? Parece que o cheiro do cocô do bebê é tão forte que vira repelente para as pessoas não visitarem a mãe. As pessoas que foram, não te olham direito, não perguntam como está, se precisa de alguma coisa, apenas querem pegar no bebê com as mãos mais sujas do mundo. Ajuda para preparar seu jantar? Limpar a casa? Lavar roupa? Fazer marmitinhas pra você? Que nada. A gente trouxe um presentinho pro bebê, mas você não é importante, você não existe mais pra sociedade, nem para os seus amigos. Esse texto está parecendo mais um papo desmotivacional, mas essa é a verdade sobre muitos casos por aí. Mesmo que não tenha acontecido com você.

Acorda de madrugada, dá de mamar, peito rachou, sangue do parto ainda descendo ou precisando de repouso da cesárea, mas marido tem de trabalhar, ou você não tem ninguém em casa pra ajudar. Ninguém diz para a gente como cuidar de um bebê. O que vemos são textos com cuidados de pessoas que têm condições de pagar uma babá, ou tem alguém para ajudar nas tarefas de casa. Não existe aquela coisa de que quando se é mãe, a gente sabe exatamente o que fazer, porque não sabemos.

A gente parece ter tudo sobre controle, mas a nossa cabeça não para. Desejamos que um arquivo em .zip seja instalado em nosso cérebro para termos como buscar as respostas para tudo. Mas o que temos são julgamentos e esquecimento.

Talvez você tenha se identificado com algo desse texto, ou achado ele totalmente exagerado, mas é sempre bom refletirmos sobre como as pessoas nos veem. Aliás, como elas não nos veem. Parece que houve troca na maternidade, mas de nós mesmas. Se fosse pelas pessoas deveríamos colocar a palavra mãe em nossa identidade, porque a antiga, já não vale mais.

A maternidade é cansativa, sabe? Isso não quer dizer que as pessoas não amem seus filhos. Pelo contrário. Quando falamos sobre romantização, falamos justamente dessa teia social que isso se tornou. De nos colocarem como guerreiras, mas na verdade, somos pessoas que estamos nos ferrando todos os dias por não termos ajuda das pessoas.

Não somos guerreiras por ter de suportar tudo sozinhas. Quando não se tem apoio, a carga é enorme. E vemos as pessoas que têm esse apoio falarem que é fácil. Precisamos parar de julgar as pessoas. Nenhuma vivência é igual a outra. Temos de começar a fazer um recorte social, senão, alimentamos a cultura da culpa que coloca na nossa cabeça que temos de ser fortes, que temos de ter sucesso, que temos de ser aquela mulher fodona que não se abate por nada, que temos de agir conforme a sociedade dita o que é certo. Isso vai nos frustrando e vamos alimentando em nós mesmos o fato de não sermos boas mães, mas você já parou pra pensar o que é ser uma boa mãe? O “ser boa”, a meu ver, é ser igual o que pedem para sejamos. Se você foge um pouco desse padrão, te crucificam e martelam na sua cabeça que você é péssima, mas não é assim que funciona.

Em meio a tantos relatos de mulheres-mães, o que mais vejo é a falta de empatia, é o autojulgamento, é a falta de ajuda! É tanta coisa que precisamos dar conta, é casa, filhos, trabalho, marido, namorado(a). É tanto julgamento de fora, é tanta cobrança, é tanta, mas tanta coisa que não caberia neste texto.

Criar uma criança nessa sociedade não é uma tarefa fácil e, sozinha, é totalmente impossível, mas é isso que querem que façamos. “Quem pariu Mateus que o embale”, mas na verdade, nosso pequeno ser social que veio ao mundo, também faz parte de tudo. E qualquer errinho (ou o que consideram erro), acontece com ele, nós seremos sempre as culpadas. Ser mãe não é padecer no paraíso. Não por nossas crias, que fique claro, mas pelo que eles e nós enfrentamos no mundo lá fora. A maternidade não é um conto de fadas, e as pessoas precisam entender isso.