Alerta: esse texto contém spoilers da série “And Just Like That”

 

Quase um ano de pandemia e o que era para ser um dos melhores anos da minha vida se tornou um dos piores. Dezembro chegou e me vi desempregada, completamente à deriva no meio do pior governo que o Brasil já viveu e em uma crise sem data para acabar. Nesse momento, me voltei para as quatro amigas nova-iorquinas que sempre me fizeram esquecer dos meus problemas.

Me lembro de assistir a Sex And The City (HBO) quando ainda era uma adolescente tentando entender como seria viver a vida como uma mulher independente. Eu ainda não tinha experiência com relacionamentos sérios e muito menos sexual mas isso não me impedia de assistir e até mesmo me ver nas protagonistas, principalmente a escritora Carrie Bradshaw (Sarah Jessica Parker). Isso por si só já era um grande sinal vermelho: como uma garota de  quinze, dezesseis anos se via em mulheres de trinta e tantos?

Hoje tenho a mesma idade de Carrie no começo da série, com alguns relacionamentos nas costas e certa experiência sexual na vida. Esse seria o momento de rever a série e me sentir representada pelo quarteto, mas o reencontro que imaginei não aconteceu. Como é possível que eu me relacionasse com ela mais nos meus 15 do que nos meus 30?

Logo no início já estava claro o porquê: Carrie não agia como uma mulher de 30 anos. Carrie era, realmente, a protagonista de sua própria história e com isso quero dizer que sua vida é totalmente autocentrada, ela só se preocupa com ele mesma, não era uma boa namorada e muito menos uma boa amiga. Muito tem sido criticado sobre a série, que recebeu o selo de “envelheceu mal”. De bifobia até transfobia explícita nas conversas do quarteto principal passando pelo elenco totalmente branco, a verdade é que Sex and The City não era tão progressista quanto se mostrava ser.

E o que isso tudo tem a ver com And Just Like That? Bom, a realidade é que quase nada mudou. O showrunner Michael Patrick King bem que tenta agradar a nova geração, mas sua tentativa de autocrítica ocorre de uma maneira nada sutil e acaba falhando no que propõe. Apesar de trazer personagens não brancos, como Lisa Todd (Nicole Ari Parker) e Dra. Nya Wallace (Karen Pittman), a maioria não tem um senso de personalidade e não sabem dizer a que vieram. A exceção fica por conta de Che Diaz (Sara Ramirez), que é puro carisma e fala umas verdades que as “meninas” precisam ouvir (apesar de não sair do lugar comum, mas como a expectativa já é baixa a gente aceita de bom grado).

Che Diaz (Sara Ramirez) e Carrie Bradshaw (Sarah Jessica Parker)

 

No entanto, muitos dos problemas de Sex And The City se repetem neste revival. Nos primeiros três episódios que foram ao ar pudemos ter uma ideia do tom que a série resolveu adotar e os problemas que serão enfrentados pelas protagonistas, que desta vez não conta com a presença de Samantha Jones (Kim Cattrall) – a desculpa dada pela série é que Samantha estaria em Londres depois de se desentender com Carrie (por isso, desde já sou #TeamSamantha). Por exemplo, apesar de vender uma ideia progressista a série em muitos momentos trata sexo com um conservadorismo que não combina com a própria proposta. Em And Just Like That isso se torna especialmente claro no arco que está sendo desenvolvido com Brady (filho de Steve e Miranda). Ao invés de tratar o relacionamento sexual do filho com uma visão saudável, a série decide tratar esse tema como alívio cômico (que não funciona) repleto de preconceito. Em pleno 2021 ver um casal de vinte e tantos anos não podendo se relacionar sexualmente sem ser motivo de piada e de uma série que se diz progressista é de causar vergonha alheia.

Outra coisa que se repete em And Just Like That  é a personalidade autocentrada de Carrie. É curioso perceber que apesar do tempo, Carrie não aprendeu nada nos anos que se passaram. Ela não amadureceu, não aprendeu ser uma amiga melhor e aparentemente só engordou a conta bancária devido ao casamento com Big (Chris Noth). No fim, o que fica claro é que tanto Sex And The City quanto And Just Like That são produtos voltados para o consumo, refletido mais nas roupas de marca, acessórios, cabelos sempre impecáveis, do que na personalidade de seus personagens ou aos problemas reais  que aparecem aqui e ali. Certa está Ana Paula Padrão que viu a série e deu sua opinião sincerona: “Tudo decepcionante”.

 

Juliana Felkze. Jornalista e cursando Letras, trabalho há quase 10 anos na área de educação.
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