A discussão para uma sociedade libertária baseada na ética no amor surge para bell hooks como um projeto de caráter anticapitalista e anticolonial, sobretudo pleiteado por mulheres, formulado a partir de políticas públicas que se fundamentam a partir dessa interpretação sobre o amor como revolução. A ética do amor para hooks é um conjunto de valores morais e pressupostos sociais que estão para além do próximo como algo dicotomizado, porque não existe dicotomização entre eu e o outro. 

É imprescindível situar bell hooks como uma escritora anticapitalista que busca um novo modelo de sociedade que não está sendo pensado a partir do método de incorporar novas perspectivas ao sistema, mas de rompê-lo em si. Em “All About Love” e “Salvation”, livros em que hooks fala do amor enquanto um projeto político, ela diz que “fazendo o trabalho do amor fazemos um trabalho anti-dominação”. Isso tudo porque precisamos repensar os nossos modos de nos relacionarmos e, ao contrário do que se parece, o amor não pode ser reduzido ao afeto. Por isso, precisamos nos deslocar eticamente para organizarmos nossas relações. 

Hooks diz que “quando escolhemos o amor, escolhemos viver em comunidade”. Mas se faz importante compreender que essa noção de comunidade está para hooks como algo que precisa ser reestruturado e que não mais dialogue com os sistema capitalista, patriarcal e colonial. Pensando desse modo, se torna difícil conceber que essa revolução parta das vivências e experiências de povos não racializados visto que esses ocupam lugares de poder, dominação e privilégios que retro-alimentam o sistema de opressão vivenciados por outros grupos. hooks vai tratar que essa mudança estrutural só irá partir de uma revolução feminista. 

Em “O feminismo é para todo mundo : políticas arrebatadoras”, a autora traz que o pensamento e prática feminista são as bases sólidas para que seja possível criar laços de amor, a partir de um feminismo visionário que centralize a discussão do amor à militância feminista. As políticas feministas historicamente travaram uma luta que tem por objetivo (mas não apenas) transportar as mulheres da servidão à liberdade, da falta de amor ao amor, vai dizer hooks. Ela ressalta também a urgência da revolução nas mudanças necessárias para tal, pontuando que “ a mutualidade é a base para o amor. E a prática feminista é o único movimento por justiça social em nossa sociedade que cria condições para que a mutualidade seja nutrida.” 

Outro ponto importante que baliza essa discussão é compreender a ética do amor também enquanto uma prática de liberdade, onde os nossos afetos não sejam mercantilizados, uma vez que o amor faz grandes críticas ao projeto capitalista que trata de transformar a crítica em produto. Sendo a ética do amor “o caminho pelo qual as políticas de conversão se concretizam”, bell traz firmemente o poder do amor enquanto ação transformadora para as mudanças sociais, entendendo que o amor é profundamente político e os nossos processos revolucionários só serão possíveis quando tratarmos ele dessa maneira. 

Assim, hooks vai dizer que na nossa sociedade o amor não se apresenta enquanto pauta política nem nos discursos mais progressistas e que sem essa discussão como central nos debates políticos se torna difícil romper com os ideias de opressão e exploração que são fortemente debatidos na luta por libertação. Ela conclui dizendo que “sem uma ética do amor moldando a direção de nossa visão política e nossas aspirações radicais, muitas vezes somos seduzidos de uma maneira ou de outra para dentro dos sistemas de opressão”. 

São urgentes os debates que tomem a discussão do amor enquanto agenda política de transformação social. Só assim é possível tencionar a nossa busca por uma liberdade que fuja do campo da individualidade, onde só se alimenta o sistema que propõe a destruição. Para isso, é fundamental reconhecer a natureza interseccional dos sistemas de opressão que vivenciamos para alcançarmos uma transformação coletiva que rompa de vez com a exploração e opressão de todes.

 

Referências

 

hooks, bell. O feminismo é para todo mundo [recurso eletrônico]: políticas arrebatadoras / Bell hooks; tradução Ana Luiza Libânio. – 1. ed. – Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 2018./

hooks, bell. All about love: New visions. Harper Perennial, 2001.

hooks, bell. Salvation: Black people and love. Harper Perennial, 2001.

https://medium.com/enugbarijo/o-amor-como-a-pr%C3%A1tica-da-liberdade-bell-hooks-bb424f878f8c

https://medium.com/pirata-cultural/o-cora%C3%A7%C3%A3o-da-quest%C3%A3o-bell-hooks-e-o-amor-9a9bb44df75e

 

Joanne Oliveira Anunciação. Mulher Sertaneja,  LGBTQI+ , 21 anos. Estudante de psicologia e membra do GERR – Grupo de Estudos em Relações Raciais da UniAges. @joanne.oliv no Instagram.

 

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