Todos estão acompanhando o grande levante popular que tem acontecido nos últimos dias no Chile. A população saiu em peso às ruas, em uma crítica feroz às políticas neoliberais que tem jogado a população chilena ao abismo. A onda de protestos reivindica melhores condições de saúde, educação, transporte e, principalmente, um novo pacto constituinte que dê garantias reais à população. A Constituição chilena é a mesma da época do sanguinário Pinochet.

Todo movimento de revolta popular é seguido de uma contraposição: a repressão. O Instituto Nacional de Direitos Humanos (INDH) chileno informou que 3.500 pessoas foram detidas desde o dia 17 de outubro, quando se iniciaram os protestos. Destas, mais de 1.100 estão também feridas. Ainda de acordo com o Instituto, existem 120 ações legais em curso por violações aos direitos humanos registrados em razão dos protestos no país. Dessas, 94 são por tortura e, entre os tipos de tortura, 18 foram relacionadas a algum tipo de conotação sexual.

No entanto, é difícil mensurar ao certo quantas violações aos direitos humanos ocorreram. Já se sabe que são 19 mortos confirmados, incluindo uma criança de apenas 4 anos. Outra notícia dá conta de três homens e um adolescente de 14 anos que foram presos e crucificados em uma antena da delegacia da região de Peñalolén. Grupos de feministas chilenas, entre eles o Abofem e o Piquete Jurídico, tem denunciado as violências sexuais e a truculência das forças policiais contra as manifestantes chilenas:

“As meninas que foram detidas, foram todas desnudadas diante de homens, contrariando a lei. Todas foram tocadas em seus genitais, e foi introduzida a ponta do fuzil ou a culatra na vagina. Perguntam a elas se querem que as viole através de sexo anal, e que isso acontece porque elas andam vadiando na rua. As chamam de vadias, de puta. Dizem que vão estuprá-las e depois matar. Muitas delas ainda não voltaram às suas casas”, apurou o UOL.

Outro caso que teve bastante repercussão foi da artista e ativista Daniela Carrasco, conhecida como “Mimo”. Ela foi encontrada enforcada em uma praça e relatos diziam que havia sido vista pela última vez sendo levada pela polícia. Houve acusações de estupro e tortura. No entanto, segundo reportagens, o Serviço Médico Legal considerou que a morte se deu por suicídio e que não haviam indícios de um ataque sexual.

É importante falar desses casos, não apenas por se tratar de uma violência de gênero, cometida especialmente às mulheres, mas também porque escancara a intenção repressiva do aparato policial. Muitas vezes, até mesmo a violência física é justificada de diversas formas. Aqui no Brasil, é o famoso “em confronto com a polícia”. Mas o estupro é algo de difícil dissimulação. Não se trata de conter a manifestação, não se trata de proteger o que quer que seja (o governo? a propriedade privada?). Se trata de subjugar a população.

Estupro não é sobre sexo, não é sobre libido, é sobre dominação. E a violência sexual é uma forma de expressão da dominação masculina, que se materializa no domínio forçado ao corpo feminino.

E o estupro é utilizado com esse propósito e sempre foi em conflitos por toda a história. Não por menos, é utilizado como arma de guerra: forças militares estupram mulheres como forma de dominação territorial e de humilhação aos derrotados em batalha.

Coincidentemente, o presidente do Chile falou que está “em guerra com um inimigo poderoso”. No entanto, nos juntamos ao povo chileno para responder que não há guerra, há repressão.

Nossa solidariedade às hermanas chilenas!

 

Atualização – 13 de Novembro de 2019

 

Segundo o jornal chileno Elmostrador, há, no momento, 93 vítimas de violência sexual por parte de militares. Das vítimas, 40 são mulheres, 30 homens, 16 meninas e 7 meninos.

O representante da INDH  apontou que “o Estado do Chile tem obrigações neste assunto de acordo com os tratados internacionais de direitos humanos e a verdade é que esse aumento exponencial de reclamações por esses tipos de práticas, onde também existem em vários casos padrões comuns dos agentes do Estado, nos mostra claramente que até o momento o Estado não está agindo com a devida diligência para impedir a violência contra as mulheres por força de ordem e segurança. Dessa forma, estaria violando a obrigação de garantir os direitos humanos que o Estado do Chile possui como os demais países que possuem tratados internacionais”.

 

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