Photo by Adam Nieścioruk on Unsplash

Mais um dia de lucidez.

Não sei bem como conviver com isso…

Bons tempos quando eu não sabia se teria pés proporcionais ao corpo e isso era o que me preocupava. Agora tenho sapatos que me cabem, mas não tenho porque usá-los, pois não tenho para onde ir.

Agora os lugares são ilhas e para chegar até elas não é preciso ter coragem, mas é necessária a insanidade daqueles que consideram não ter mais nada a perder.

Olho a TV e vejo vários desse tipo, pobres coitados, anestesiados pela angústia ou acelerados pela normalidade dos dias que nos enganam com a promessa de que o esforço da aniquilação do prazer de viver a vida, de verdade, vai nos trazer recompensas que sequer conseguimos imaginar possíveis.

Mas, talvez eu fosse uma dessas pessoas, coitadas, imersas no trabalho. Isso há alguns anos, preenchendo a vida com tarefas e a deixando sem espaço para respirar. Isso há alguns meses, quando, mesmo dando espaço ao lazer, o trabalho reprimia quase toda vontade, anestesiava a potência e me fazia crer que deveria subjugar minha alma a ele.

Como superar essa normalidade? Como sobreviver a ela sem, contudo, deixar de lado a própria vida?

O insulto da normalidade não é parar de lavar as mãos a cada instante ou ir para a rua como se nada mais importasse, mas é viver como se pudéssemos zerar tudo, esquecer daqueles que mais sofrem durante esse período…

Mas parece que a pandemia nem acabou e já voltamos a esse estado de transe.

 

Valéria Santos Paulo. Assistente Social e Cientista Social, especializada em Gênero e em Psicologia Social. Amante das artes.
Compartilhe...