Falar sobre parto, pra mim, é sempre algo que não traz boas lembranças. Há nove anos, engravidei. Era nova não conhecia nada sobre plano de parto, violência obstétrica, parto humanizado e meus direitos como grávida. Periférica e com pouca informação sobre o assunto, pude depois de muitos anos descobrir que passei por uma violência obstétrica que eu não queria ter passado.

 

Meu parto

 

Meu trabalho de parto foi até rápido. Senti as contrações às 8h da manhã e às 11h55 meu pequeno nasceu, mas neste meio tempo, senti muitas dores e foi aí que a violência começou.

Apesar das contrações e de já estar com as semanas completas, fiquei no soro com ocitocina. Para quem não sabe, esse soro acelera o procedimento do parto. Após isso, fui tocada por dos estudantes que estavam no dia (o famoso exame de toque) sem minha autorização.  Depois, fui para a sala onde o soro poderia fazer efeito. Minha bolsa não estourou naturalmente, então, estouraram por mim no momento do parto.

Fui para a sala de parto. Sentia muitas dores, gritava de dor e não tive, em nenhum momento, palavras de conforto, pelo contrário, disseram que eu estava descontrolada e precisava de tratamento psicológico, dando a entender que estava louca.

Eu fazia muita força, mas ele não saia. Depois de muito tempo fazendo força e gritando, vieram duas enfermeiras de cada lado e fizeram força para baixo na minha barriga como quem estivesse espremendo o restinho de uma pasta de dente. Elas subiram em cima de mim e empurravam, mas meu filho não saia, eu sentia muitas dores e chorava demais.

Então, sem saber muito o que estava acontecendo, senti como se meu filho tivesse sido puxado da minha vagina. Acredito que neste momento foi quando fizeram a Episiotomia. Eu não queria vê-lo no começo, só chorava de medo e, ao mesmo tempo, de alívio por aquele tormento ter passado. Foram limpá-lo aí veio o dado: “Seu filho nasceu com 4,100kg” (grande, né?). Olhei pra trás e não vi o pai dele (estava casada na época). Além de tudo não o chamaram para assistir ao parto, apenas quando ele terminou. Então, fui costurada e enviada ao quarto.

 

Episiotomia e ponto do marido

 

Depois que todo o procedimento passou, não me informaram nada sobre o que tinha acontecido com meu corpo. Eu sangrava bastante a cada mexida que dava, não me falaram se aquilo era normal ou não. Apenas quando eu perguntei – morrendo de medo – se iria morrer de tanto sangue que descia de mim descobri que era a tal “sujeira do parto”, por assim dizer. Fui para casa com pontos, dores e, na minha cabeça, a ideia de que um parto normal deveria ser muito mais tranquilo. Eu não sabia o que tava acontecendo, não conseguia usar o banheiro, sentia meus pontos me incomodando. Nada estava lindo e maravilhoso como eu via nos sites de bebê.

Sobre voltar a ter relações sexuais, demorei bem mais que a quarentena porque ainda me sentia insegura. Depois de 3 meses, resolvi tentar e senti muita dor. Era como se eu tivesse perdendo a virgindade de novo. Senti isso algumas vezes mesmo depois de ter tido relações e até hoje sinto algumas dores e incômodos com penetração. Então, pesquisando sobre o assunto, descobri que passei pelo “ponto do marido”.

 

Tipos de violência obstétrica

 

Dentro do meu relato, quem já tem um conhecimento básico sobre o assunto, pode ter identificado alguns tipos de violência obstétricas que eu sofri.

Primeiramente violência obstétrica é toda interferência dos médicos em cima de procedimentos que deveriam ser “naturais”, além de xingamentos, maus-tratos e todo o tipo de absurdo que vemos nos partos afora.

  1. Soro com ocitocina: Conforme dito acima, o soro com ocitocina faz com que o seu útero gere contrações, facilitando o tempo de trabalho de parto. A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que não seja usada de forma rotineira para acelerar o trabalho de parto de mulheres saudáveis.
  2. Tocada sem autorização ou muitas vezes sem necessidade: O exame de toque é feito para ver o quando o útero está dilatado para a saída do bebê, mas o toque por várias vezes e sem necessidade é considerada violência, ainda mais quando é feito por estudantes sem autorização da grávida.
  3. Humilhações, xingamentos, preconceito: Falar para a mãe que ela está louca, descontrolada é também uma violência. Além disso, dizer palavras como “quando abriu as pernas não pensou na dor”, ou outras coisas ainda piores, como agredir fisicamente.
  4. Episiotomia: Este procedimento é feito para facilitar a saída do bebê, ou seja, ampliar o canal de parto que consiste em fazer uma incisão na região do períneo (área muscular entre a vagina e o ânus). Segundo o site “Tua saúde”, as principais sequelas deste procedimento são: Incontinência urinária; Infecção no local do corte; Aumento do tempo de recuperação do pós-parto.
  5. Ponto do Marido: Este procedimento é pouco conhecido, mas muitas mulheres já passaram por ele sem saber. Este é um “ponto a mais” que é feito quando a sutura da Episiotomia está sendo feita. Este ponto é chamado assim pois acredita-se que a vagina vai ficar mais “apertada” para o companheiro. “O ponto do marido é um ponto que se faz ao término da sutura de uma episiotomia, onde se ‘aperta’ a entrada da vagina, com o intuito de torná-la mais estreita, teoricamente aumentando a satisfação sexual do marido”.
  6. Manobra de Kristeller: Ao subirem na minha barriga e fazerem força para baixo nela, senti dores, afinal, duas mulheres estavam em cima de mim. Este procedimento é chamado de Manobra de Kristeller que consiste em pressionar a parte superior do útero para facilitar (e acelerar) a saída do bebê.

Essas são as violências que sofri há oito anos quando meu pequeno nasceu. Existem muitas outras e mulheres ainda passam por isso. Eu não tinha tanto conhecimento que agora, se não, teria denunciado. Isso pode ser feito através da Defensoria Pública válido para serviço público ou privado, pelo telefone no 180 (Violência contra mulher) ou 136 (Disque Saúde).

Fale com outras mulheres, busque aprender sobre seu corpo, sobre violência obstétrica porque quanto mais conhecimento temos sobre o assunto, mais podemos lutar contra ele.

Baixe aqui a cartilha feita pela Defensoria Pública sobre Violência Obstétrica.

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