Essa mulher é um acontecimento. Se ainda não a conhece, prepare-se. Capa da edição de julho da revista New York, Michaela Coel é atriz, roteirista, diretora, produtora, poeta e até mesmo cantora. Não é por menos que já apareceu em vários posts por aqui. A britânica de origem ganense têm tido seu talento reconhecido, entre outras coisas, pela originalidade. Aos 32 anos, sua mais recente produção é a série da BBC e da HBO “I may destroy you”, que ela escreveu, produziu e protagonizou. A obra é classificada pela crítica como uma das melhores da temporada.

A multitarefas Michaela Coel tem uma história de vida que nos lembra que toda experiência deixa um aprendizado. Aos 18 anos, deixou a faculdade de Ciências Políticas após apenas dois meses de curso. Também tentou cursar literatura inglesa e teologia, porém desistiu. Durante essa época, começou a escrever e a atuar em bares de Londres, até ser “descoberta” pelo escritor Ché Walker, que a incentivou a estudar música e teatro. Enquanto fazia aulas e atuava em peças da faculdade, Michaela começou um blog, o “Michaela a Poeta” (Michaela, the Poet, em inglês), que usou como uma espécie de diário.

Em 2015, estourou com a série “Chewing gum”, protagonizada e escrita por ela. A obra, inclusive, lhe rendeu dois prêmios BAFTA de cinema. Em 2018, protagonizou a eletrizante “Black earth rising”, top dez de nossas favoritas da vida. Sua filmografia inclui ainda episódios de “Black mirror”, entre outros trabalhos. E há ainda as peças de teatro do início da carreira, inclusive a que inspirou “Chewing gum”.

Com sua mente, voz e beleza imponentes, Michaela é uma força da natureza. Todas as suas obras parecem hipnotizar, lotadas de verdade. Literalmente. As duas séries que escreveu são baseadas em histórias pessoais reais. Seu talento e capacidade de executar diversos papéis na mesma produção são impressionantes. Segundo a New York, Michaela “nunca tentou se encaixar nas velhas maneiras de fazer as coisas”.

Todas as suas produções merecem ser assistidas mas aqui vamos falar um pouco das nossas duas preferidas: “I May destroy you” e “Black Earth Rising”.

 

I May destroy you

 

Uma das séries mais elogiadas da temporada, “I may destroy you” não conquistou tantos fãs à toa. A produção trata de assuntos tão contemporâneos quanto urgentes. O tema principal é o abuso sexual, mas há ainda discussões sobre comportamento nas redes sociais, racismo, relacionamentos, dificuldades desta geração de se encaixar no mercado de trabalho tradicional e viver do que ama. Como diz uma matéria do “The Guardian”, a série de Michaela Coel está em um patamar em que seu sucesso é inquestionável.

“I may destroy you” é baseada em uma história vivida por Michaela, a protagonista, roteirista, produtora e co-diretora, que transformou uma experiência traumática que sofreu em 2015 no roteiro da série.

Enquanto filmava sua primeira produção para a tv, “Chewing gum”, ela foi vítima de um estupro após ser dopada. Na série, a personagem Arabella, uma escritora londrina, passa pelo mesmo.

A série me fez repensar muitos comportamentos. O que aconteceu com Arabella poderia ter acontecido comigo, com uma amiga… E como teríamos reagido? Teríamos ao menos entendido? Há muitas nuances mal interpretadas (ou conhecidas?) sobre o que é o abuso sexual, ainda mais se ele envolve uma jovem que estava aparentemente se divertindo enquanto bebia com os amigos. Parece simples dizer que estupro se configura quando não há consentimento. Mas não é simples.

Em entrevista publicada no UOL, Michaela disse:

“É gratificante poder escrever uma história do passado e reviver aquele sofrimento, mas perceber que estou aqui, no presente, e ainda assim ser capaz de sentir aquela dor. Isso significa que eu a sobrevivi”.

“I May Destroy You” tem ainda dois personagens maravilhosos, que ampliam as discussões: Kwame (Paapa Essiedu) e Terry, ou T (Weruche Opia), perfeita sem defeitos <3

Se você quiser saber mais sobre a série vale ler o post da Vanessa Martz aqui no nosso blog.

 

Black Earth Rising

 

Se você assistiu “I May Destroy You”, prepare-se para ver Michaela Coel totalmente diferente em “Black Earth Rising”. No drama político de 2018, a atriz interpreta Kate Ashby, uma jovem investigadora sobrevivente do genocídio de Ruanda. Resgatada quando criança, foi adotada por Eve Ashby (Harriet Walter), uma promotora britânica reconhecida internacionalmente.

Eve começa a atuar em um julgamento no Tribunal Penal Internacional de um líder de milícia Hutu que participou dos conflitos na República Democrática do Congo, vizinho de Ruanda e com papel importante no genocídio. Até que uma reviravolta acontece e ela passa a trabalhar com Michael Ennis (John Goodman, maravilhoso) também na investigação de crimes de guerra na África. Kate se depara então com as sombras de seu passado e suas raízes.

Além de muito bem feita, ao estilo das séries originais da Netflix, que te fazem querer ver um episódio atrás do outro, “Black Earth Rising” joga luz em um absurdo episódio da nossa história recente. Entre abril e julho de 1994, centenas de milhares de pessoas (cerca de 800 mil) foram perseguidas e mortas apenas por pertencerem à etnia Tutsi – a de origem de Kate. Pessoas consideradas adversárias políticas, independentemente de sua origem, também foram massacradas. Para saber mais sobre o genocídio, indicamos a leitura da reportagem “Entenda o genocídio de Ruanda de 1994: 800 mil mortes em cem dias” da BBC. A matéria ajuda também a entender muitos conflitos e diálogos da série.

Como disse John Powers (NPR), a série nos lembra que a “História é vasta, complicada e sempre pode mudar”.

 

Nesse post indicamos:

I May destroy you –  disponível na HBO

Black Earth Rising – disponível na Netflix

 

Links Não me Kahlo:

https://naomekahlo.com/eu-amo-michaela-coel-e-vou-protege-la/

https://naomekahlo.com/we-may-destroy-you/

Links mencionados:

Matéria BBC: https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2014/04/140407_ruanda_genocidio_ms

Revista New York: https://nymag.com/press/2020/07/on-the-cover-of-new-york-magazines-tv-issue-michaela-coel.html

UOL: https://entretenimento.uol.com.br/noticias/redacao/2020/06/15/michaela-coel-brilha-em-i-may-destroy-you-minha-terapeuta-esta-orgulhosa.htm

The Guardian: https://www.theguardian.com/tv-and-radio/2020/jul/10/michaela-coel-i-may-destroy-you-bbc-arabella-assault-racism

NPR: https://www.npr.org/2019/01/30/689892841/black-earth-rising-is-a-fascinating-if-clunky-take-on-the-rwandan-genocide

 

Compartilhe...