O “B” da sigla LGBTQIA+ não é de biscoito! Às vezes parece que o “B” fica ali esquecido entre todas as outras letrinhas. Tanto que o unicórnio, ser mítico e irreal, foi apropriado como símbolo da bissexualidade. Se a invisibilidade é um problema que bissexuais enfrentam, não seria diferente com relação a sua representação na mídia.

 

Séries que representam o “b”

 

Ainda não estamos vivenciando um momento ideal de grande representação bissexual na mídia, mas alguns personagens passaram a existir e agradar o público. Talvez um dos mais importantes tenha sido o Darryl, da série Crazy Ex-Girlfriend, que retrata toda uma jornada de descoberta feita por um homem de meia-idade. Darryl Whitefeather é um exemplo de trabalho bem feito pelos escritores, e “Getting Bi” a música cantada por ele é um ícone televisivo— pense em qualquer outro homem cantando sobre o orgulho em ser bissexual e não vai conseguir.

 

 

Outra personagem cuja trama encantou muitos, foi Callie Torres de Grey’s Anatomy descobrindo sua sexualidade. Ela continuou em casos com homens e mulheres, até achar uma companheira em Arizona. Algo que muitos fãs não engolem até hoje, é como toda a trama foi desenrolada em seu final. O final do juizado, para os bons entendedores da trama. Callie era tida como ícone bissexual, e de repente, sua personagem foi jogada numa trama muito abaixo de quem ela era. No entanto, preferimos ficar com seus melhores momentos e a frase dita por ela: “Existe um b’ ali e não significa badass. Tudo bem, significa, mas também significa bi.”

Rosa Diaz, em Brooklyn-99, também foi outra personagem bissexual capaz de ter um desenvolvimento orgulhoso. Isso com direito a uma cena de confissão para os pais e tudo, onde a atriz Stephanie Beatriz conseguiu levar toda carga dramática necessária, o peso que existe nas costas de alguém que se identifica como bissexual— e ela também é bi na vida real!

Outros personagens bissexuais também andam em alta, com tramas em destaque: no explosivo Elite, da Netflix, temos personagens representando o espectro e que vão crescer com a nova geração. A nova audiência. Mesmo no Brasil, temos “As Five” que traz uma representação bissexual feita com esmero. Inclusive, uma das atrizes, Ana Hikari, já falou publicamente sobre ser bissexual.

 

Rosa Diaz de Brooklyn99.

 

 

Representações não tão boas…

 

Infelizmente, para a cultura pop, personagens LGBTQIA+ podem ser usados como recursos de “blink it and you’ll miss it” (pisque e você vai perder). Isso significa que uma série introduz personagens LGBTQIA+, mas não explicitamente. Aliás, tão, mas tão sutilmente, que se você pisca, você nem percebe que são LGBTQIA+. Algumas séries passam anos e mais anos arrastando fãs na dúvida. Sim, estamos falando de você, Supernatural.

A série também traz outro problema quanto aos queridos personagens bi: o queerbaiting. Para os não familiares com o conceito, é um “eles vão ou não”, mas na versão “eles são ou não”. Mais de uma década para Castiel (spoilers adiante): parar no inferno por amar Dean Winchester. Além disso, nenhum dos executivos envolvidos falou sobre o tema, basicamente o ator Misha Collins teve de gravar toda a cena diante de uma tela de CGI – mas isso, devido ao coronavírus.

Exemplos de queerbaiting: Sherlock e Watson, da BBC. Kara e Lena, de Supergirl, na CW. Dean Winchester e Castiel, também da CW. Emma e Regina, de Once Upon a Time, Watson e Moriarty em Elementary, Betty e Veronica de Riverdale (olá novamente, CW), Peggie Carter e Angie em Agent Carter, além de uma das mais polêmicas: Grace e Frankie. Perceba que todos esses exemplos acabam caindo na referência do “ele/ela é, ou não, bissexual?”.

 

. Emma e Regina, de Once Upon a Time

 

A análise pode ter diversos ângulos, como os vários elogios dados, mas que não cabem quando volta seu foco para a comunidade LBTQIA+. Mais recentemente, tivemos a atenção direcionada para a personagem Beth Harmon, de “O Gâmbito da Rainha”.  A série é boa? Sim, excelente. Incluir Beth na comunidade bissexual por conta de duas referências breves, e numa série onde esmagadora maioria do plot é hétero, e claramente feito sob as lentes de um homem? Bom, isso já é outro assunto. Algo parecido acontece com “The Good Place”, onde a personagem de Kristen Bell só teve sua sexualidade confirmada fora da série. Ou seja, se você não é um dos ávidos curiosos por bastidores, isso acabou por passar da sua alçada.

A esperança mora aqui: para cada brincadeira, piada, ou objetificação de personagem bissexual ou LGBTQIA+ na mídia, nascerá uma história escrita como a de Sex Education, Crazy Ex-Girlfriend, ou até mesmo, aqui no Brasil, com uma “Malhação” escrita para jovens adultos e mostrando a realidade que eles enfrentam.

 

Alguns dados importantes da vida real.

 

A Medical News Today revelou em estudo de 2020 sobre saúde mental dos australianos, que 72% dos participantes bissexuais apresentaram altos níveis de estresse. Outra pesquisa também demonstrou que o bissexual tende a apresentar níveis maiores ou equivalentes de depressão e ansiedade do que gays e lésbicas. Em particular, mulheres bissexuais apresentam níveis maiores de ansiedade do que homens hétero e lésbicas.

O mesmo se apresenta para homens bissexuais em comparação com homens cis-hétero. A depressão e a bissexualidade estão intrinsecamente ligados por, de acordo com a matéria, três fatores: a discriminação e estigma que sofrem tanto fora quanto na própria comunidade; o apagamento de personagens bissexuais e a falta de apoio de maneira generalizada. Quantas vezes alguém teve de ouvir que estava confuso, que para ele/ela era mais “fácil”, ou que iria terminar numa relação monogâmica com alguém do sexo oposto? Para os abertamente bissexuais, não foram poucas as vezes que escutaram esse tipo de questionamento.

É por isso que a mídia representa um papel tão importante tanto na saúde mental, quanto no dia-a-dia de alguém bissexual que apenas quer seguir sua vida, monogâmica ou não, pregando o amor para homens e mulheres. Não existe agenda, confusão, ou nada do tipo. Bissexuais são válidos, vão continuar sendo, e que sejam capazes de falar mais e mais alto a cada estação.

 

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