Me pergunto se nós, mulheres, nos inserimos em algumas situações. Se permitimos a autossabotagem, a síndrome da impostora, se nos colocamos em relacionamentos abusivos, escolhemos passar por coisas pelo simples fato de querermos. Sou mãe e, por algum tempo, meu filho não morou comigo. Escrevi alguns artigos sobre o assunto e, ao conversar com outras mulheres na mesma situação, tive certeza que elas não escolheram essa condição. A mesma coisa com relacionamento abusivo.

Ninguém quer passar por constrangimentos psicológicos, ser machucada, abusada, perseguida. Ainda, infelizmente, temos a ideia construída de que há um príncipe (ou princesa) encantado esperando no cavalo branco para nos salvar dos apuros. Infelizmente, nossa infância foi marcada pelos contos de fada. Não é à toa que temos falado mais sobre o “desprincesamento” para as nossas meninas.

Na rua, quando sofremos assédio, não queremos isso. Só porque está um dia de sol “não podemos” andar com shorts curto pois somos devoradas com os olhos. Ninguém quer passar por assédio no trabalho. Sofrer gordofobia, racismo, machismo. Mas por que passamos todas essas coisas? Somos nós mesmas que nos colocamos em todas essas situações?

Acredito fielmente que na maior parte dos casos citados acima há o famoso condicionamento. Sim, somos coagidas por família, amigos, no trabalho. Não é fácil desapegar de um homem que cuja dependência emocional passou “dos limites”, não é simples não morar com seus filhos, você precisa viver nessa condição por um tempo para poder trabalhar, estudar ou qualquer outra coisa que precise fazer. Não é fichinha passar por assédio! Se está calor e você usa um vestido, você não quer sair toda coberta — não que isso impeça qualquer abuso. Então, não acredito que permitamos nada disso.

Há quem diga que escolhemos, na vida passada, viver algumas coisas para poder aprender. Não quero julgar a crença de ninguém, mas é totalmente desumano escolher reencarnar para sofrer. Ninguém quer isso! Queremos todos os dias viver bem, sem violência, andar seguras, ter qualidade de vida, saúde, educação, moradia, e só de pensar que eu escolhi passar por traumas — que só terapia e medicação estão ajudando a superar — e que me deixo passar por coisas péssimas que vivi até hoje, me faz pensar que sou uma pessoa burra pra caramba. Ou todas somos.

 

Auto isso, auto aquilo.

 

Quando o assunto é autossabotagem e síndrome da impostora, não é diferente. Bom, se analisarmos a palavra “auto”, já sabemos que estamos nos limitando por algum motivo (a depender da vivência de cada uma). Ok, entendido, mas é importante vermos além disso. Daí eu te pergunto: o que te levou à essa situação? Por que você se sabota?

Escrevi uma vez sobre o tema (a autossabotagem e a síndrome da impostora) ser uma questão social e continuo com a mesma ideia. Pra ficar mais claro, vamos fazer um recorte social e racial. Mulheres negras, por exemplo, ainda são menos representadas na arte como um todo, nos relacionamentos, preteridas; as indígenas, a mesma coisa.

A partir do momento que você se depara com portas fechadas, falta de oportunidade, racismo, machismo, tudo isso relacionado à sua etnia, cor da pele, o que chamamos de autoestima vai por água abaixo. Nisso, as autocobranças chegam, a falta de representatividade é visível. Elas dão match. E as frases: “Não sou boa o suficiente”, “Não sou linda igual”, “Esse relacionamento não vai pra frente porque uma hora serei abandonada” chegam e derrubam, e aí, já sabe… O que era para ser empoderador, se torna uma sequência de sabotagens diárias. Este é apenas um exemplo.

Então você se fecha, recusa oportunidades, diz não ser suficiente, se coloca em relações cujas migalhas parecem pratos fartos. Se deixa levar por qualquer palavra de afeto e coloca isso como uma promessa de amor eterno. Se esconde porque não se acha digna de ser amada… A culpa chega de mãos dadas com o autojulgamento. E você se afunda. Até chegar uma hora que parece que ninguém te ouve. A partir de tudo isso, volto à questão feita logo acima: você se colocou nessa posição? Não, você foi condicionada a viver numa sociedade machista, capitalista que te vê como um objeto: um útero para parir, um corpo para satisfazer, uma profissional incompetente, uma mãe ruim. E para sair desse círculo vicioso é preciso muito trabalho de amor-próprio e não só isso, mudanças sociais também são mais que necessárias.

 

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